- Identifique variáveis-chave (Vi, Vf, Ci, Cf) e mantenha unidades consistentes
- Aplique C1V1 = C2V2 e, quando preciso, calcule Vf por soma ou diferença
- Escolha a expressão adequada: molaridade, molalidade, porcentagens ou ppm
- Use fator de diluição e séries para alcançar concentrações-alvo com precisão
Calcular concentrações e realizar diluições é parte do dia a dia de qualquer laboratório, seja em ensino, pesquisa ou indústria. Mesmo quem já viu esse assunto várias vezes pode ficar em dúvida na hora H, especialmente quando entram em cena diferentes unidades, fatores de diluição e expressões como molaridade, molalidade ou porcentagens.
Para te guiar com segurança, este artigo reúne, integra e explica de forma direta todos os conceitos e fórmulas essenciais: o que é diluir, quais variáveis entram nos cálculos, como usar a equação de diluição C1V1 = C2V2, como lidar com unidades, além de exemplos completamente resolvidos e dicas práticas para evitar erros comuns na bancada.
O que significa diluir e por que isso importa
Quando diluímos, estamos adicionando ou retirando solvente de uma solução, modificando sua concentração sem alterar a quantidade de soluto presente na porção transferida. Isso permite trabalhar com soluções menos concentradas para titulações, ensaios analíticos e padrões de calibração, garantindo segurança, precisão e reprodutibilidade.
Em muitos laboratórios, as soluções são mantidas como “estoque” mais concentrado (por praticidade e menor risco de contaminação) e, conforme a demanda, são preparadas soluções de trabalho por diluição. Essa estratégia economiza tempo e assegura que sempre haja material pronto para os ensaios.
Variáveis fundamentais nos cálculos de diluição
Ao realizar qualquer diluição, você se depara com grandezas recorrentes. Saber nomear e relacionar essas variáveis é metade do caminho:
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Vi (volume inicial): volume da solução de partida.
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Vf (volume final): volume da solução após a diluição.
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Ci ou Mi (concentração inicial): concentração comum (C) ou molar (M) antes de diluir.
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Cf ou Mf (concentração final): concentração resultante depois da diluição.
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Va (volume de solvente adicionado): quantidade de diluente inserida para reduzir a concentração.
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Vr (volume de solvente retirado): quando a estratégia for concentrar por remoção de solvente.
Como determinar o volume final (Vf) em cada situação
Se a diluição se dá por adição de solvente, o volume final é a soma do volume inicial com o volume de solvente adicionado:
Vf = Vi + Va (essa relação é direta e intuitiva).
Quando a operação envolver remover solvente, o volume final é calculado por diferença:
Vf = Vi − Vr (reduzindo o volume total, a concentração aumenta).
Equação de diluição para concentração: C1V1 = C2V2
A relação clássica de conservação do número de mols do soluto afirma que Ci · Vi = Cf · Vf. Quando trabalhamos em molaridade, a forma fica Mi · Vi = Mf · Vf. Essas expressões são equivalentes, desde que as unidades sejam consistentes.
Regra de ouro de laboratório: mantenha os volumes na mesma unidade (mL com mL, ou L com L) e as concentrações também coerentes (por exemplo, todas em mol·L−1). Isso evita fatores de conversão perdidos, que são a causa mais comum de erro.
Exemplos resolvidos passo a passo
Exemplo 1 (PUC-RS): Foram adicionados 35,00 mL de água a 15,00 mL de uma solução 0,50 M de KMnO4. Qual é a nova molaridade? Alternativas: a) 0,050; b) 0,075; c) 0,100; d) 0,150; e) 0,175. Vamos organizar os dados e resolver com calma:
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Vi = 15,00 mL; Va = 35,00 mL; Mi = 0,50 M; Mf = ? (primeiro, calcule Vf)
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Vf = 15,00 + 35,00 = 50,00 mL (volume final após a adição de solvente)
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Mi · Vi = Mf · Vf → 0,50 · 15,00 = Mf · 50,00
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7,50 = 50,00 · Mf ⇒ Mf = 7,50 / 50,00 = 0,15 M (alternativa d)
Exemplo 2: Deseja-se preparar 200 mL de HCl 1,0 M a partir de uma solução estoque 5,0 M. Qual Vi da solução estoque deve ser utilizado? Use a mesma equação de diluição:
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Mi = 5,0 M; Mf = 1,0 M; Vf = 200 mL; Vi = ?
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Mi · Vi = Mf · Vf → 5,0 · Vi = 1,0 · 200
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5,0 · Vi = 200 ⇒ Vi = 200 / 5,0 = 40 mL (e o restante até 200 mL é solvente)
Exemplo 3 (FURG): Quantos mL de água devem ser adicionados a 100 mL de NaOH 0,20 M para obter 0,050 M? Aqui primeiro escrevemos Vf como soma:
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Vi = 100 mL; Mi = 0,20 M; Mf = 0,050 M; Va = ?
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Vf = 100 + Va (porque vamos acrescentar solvente)
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0,20 · 100 = 0,050 · (100 + Va) ⇒ 20 = 5 + 0,050 · Va
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15 = 0,050 · Va ⇒ Va = 15 / 0,050 = 300 mL (adição necessária)
Termos essenciais: solução, soluto, solvente, concentração e solução estoque
Chamar cada coisa pelo nome ajuda a não se perder nos cálculos. Solução é uma mistura homogênea de soluto (o que se dissolve) e solvente (o meio que dissolve). “Concentração” é a relação entre a quantidade de soluto e a quantidade total da solução ou do solvente, dependendo da unidade escolhida.
Além disso, na prática de laboratório é comum ter uma solução estoque (concentrada), que será diluída tantas vezes quanto necessário para gerar soluções de trabalho, geralmente menos concentradas e prontas para uso.
Unidades e expressões de concentração mais usadas
Para padronizar resultados entre métodos e laboratórios, a IUPAC recomenda expressar a “quantidade de matéria” em mol, o que torna a molaridade uma escolha muito conveniente em química analítica e industrial.
Molaridade (M)
A molaridade é o número de mols de soluto por litro de solução: M = n (mol) / V (L). Se trabalhar com massa, use M = m / (Mmolar · V), em que m está em gramas, V em litros, e Mmolar em g·mol−1.
Exemplo rápido: NaCl possui massa molar ~58,44 g·mol−1 (22,99 para Na e 35,45 para Cl). Dissolver 58,44 g em 1,00 L produz uma solução 1,0 M de NaCl. Para 0,10 M, use 5,844 g em 1,00 L; para 0,50 M, 29,22 g; para 2,0 M, 116,88 g.
Molalidade (m)
A molalidade relaciona o número de mols de soluto por quilograma de solvente: m = n (mol) / massa do solvente (kg). Uma forma prática de cálculo é: m = 1000 · m1 / (m2 · Mmolar), em que m1 é a massa de soluto (g), m2 a massa de solvente (g) e Mmolar em g·mol−1.
Porcentagens
Em laboratório, usamos principalmente três expressões: % (m/m) = (massa de soluto / massa da solução) × 100; % (v/v) = (volume de soluto / volume da solução) × 100; e % (m/v) = (massa de soluto / volume da solução) × 100.
Exemplo de % (m/v): solução de NaCl a 10% (m/v) contém 10 g de NaCl em cada 100 mL de solução; pese o soluto, dissolva com parte do solvente e só então complete o volume no balão volumétrico até a marca final.
Partes por milhão (ppm)
Quando as quantidades são muito pequenas, ppm facilita a comunicação: 1 ppm = 1 parte de soluto em 106 partes de solução. Em água, aproximadamente, 1 mg por L corresponde a 1 ppm (à temperatura ambiente e densidade próxima de 1 g·mL−1).
Fator de diluição e a equação C1V1 = C2V2
Chama-se fator de diluição ao número de vezes que o volume da alíquota é ampliado após diluir: FD = Vfinal / Valíquota. Assim, uma diluição 1:100 significa FD = 100 (uma parte de amostra em 99 partes de diluente, totalizando 100 partes).
Exemplo prático: adicionando 0,10 mL de amostra a 9,90 mL de diluente, obtemos 10,00 mL ao final. FD = 10,00 / 0,10 = 100 (diluição 1:100). Em termos de concentração, C1V1 = C2V2 continua valendo, e o solvente a acrescentar é V2 − V1.
Diluições seriadas (ou em série)
Quando precisamos atingir diluições muito grandes, fazemos diluições sucessivas de mesmo fator, multiplicando o efeito total. Se cada passo for 1:2, após três passos o fator global é 2 × 2 × 2 = 8 (1:8).
Para montar uma série, pegue 0,10 mL do concentrado e junte a 0,90 mL de diluente (1:10). Do novo tubo, retire 0,10 mL e repita. Isso constrói uma escala logarítmica de concentrações, útil para curvas analíticas, determinação de títulos e contagem de microrganismos.
Como preparar uma diluição: passo a passo claro
Antes de qualquer coisa, defina o volume final que deseja obter (por exemplo, 30 mL). Esse volume é a soma da alíquota (parte da solução mais concentrada) com o diluente.
Depois, escreva a diluição na forma de razão: 1/20 significa FD = 20. A partir disso, o volume da alíquota é Valíquota = Vfinal / FD = 30/20 = 1,5 mL (e o diluente será 28,5 mL).
Se conhecer concentrações inicial e final, use C1V1 = C2V2 para achar V1 e calcule o solvente como V2 − V1. Isso funciona para C comum, molaridade e até porcentagens, desde que mantenha as unidades coerentes.
Vale reforçar uma prática segura: sempre dissolva o soluto primeiro em parte do solvente e só então complete o volume em balão volumétrico até a marca; medir “100 mL de água + 10 g de soluto” não garante 100 mL de solução por causa da contração/expansão de volume.
Porcentagens na prática: m/v, v/v e m/m
Para % (m/v), a fórmula é × 100. Uma solução 10% (m/v) de NaCl em 100 mL contém 10 g de sal no volume final, não 10 g adicionados a 100 mL de água.
Quando o soluto é líquido, % (v/v) ajuda: × 100. Exemplo: 5% (v/v) de etilenoglicol em 1000 mL → 50 mL de soluto e completar com água até 1000 mL (aprox. 950 mL de água).
Para % (m/m), use massas de soluto e de solução. É comum em formulações industriais, em que a densidade e a temperatura são controladas e registradas.
Relações úteis entre concentração comum, densidade e título
Alguns problemas pedem para transitar entre diferentes expressões. A relação C = 1000 · d · T (C em g·L−1, d em g·mL−1 e T como fração em massa) permite converter dados de densidade e título em concentração comum.
Outro atalho prático é lembrar que, em soluções diluídas aquosas, 1 ppm ≈ 1 mg·L−1, o que simplifica rapidamente estimativas na bancada e em relatórios.
Mais exemplos resolvidos (com atenção às unidades)
Soro fisiológico (UFSCAR): 0,900 g de NaCl em 100 mL de solução. Calcule a molaridade. Massa molar do NaCl = 58,5 g·mol−1. Converta 100 mL para 0,100 L.
M = m / (Mmolar · V) = 0,900 / (58,5 · 0,100) = 0,900 / 5,85 = 0,154 mol·L−1 (resultado clássico para soro 0,9%).
Concentração comum: dissolvendo 24 g de sacarose e completando para 500 mL (0,500 L), temos C = m / V = 24 / 0,500 = 48 g·L−1. Note a conversão de mL para L para manter as unidades corretas.
Dicas práticas e erros comuns a evitar
• Unidades consistentes: manter volumes todos em mL ou todos em L evita enganos no C1V1 = C2V2.
• Não some volumes “a seco”: dissolva e complete até a marca em balão volumétrico para garantir o volume final real.
• Anote densidade e temperatura quando trabalhar com % (m/m) e % (v/v) e consulte as propriedades físicas da água, pois podem afetar significativamente os cálculos.
• Medição correta: use pipetas/dispensadores calibrados e verifique o menisco no nível dos olhos; pequenos desvios geram grandes diferenças em diluições seriadas.
• Rotule tudo (concentração, data, operador) e armazene de forma adequada;
• Releia o método e confira se os cálculos pedem concentração comum, molaridade, molalidade ou título;
• Recalcule rapidamente um exemplo antes da execução para pegar inconsistências.
Aplicações típicas de diluições seriadas
Em microbiologia, as séries de 1:10, 1:100 e 1:1000 são padrão para contagem de colônias e estimativas de concentração celular. Em química clínica e bioquímica, elas constroem curvas de calibração com escala logarítmica, facilitando regressões lineares e análise de sensibilidade.
A técnica também é útil quando há pouco volume de amostra ou de diluente, pois permite atingir grandes fatores de diluição com consumos mínimos por etapa (por exemplo, 0,1 mL + 0,9 mL, repetidamente).
Checklist rápido para montar uma diluição
1) Defina o alvo: concentração final e volume final desejados.
2) Escolha a unidade: molaridade, % (m/v), etc.; mantenha tudo coerente.
3) Aplique C1V1 = C2V2 para obter o volume da alíquota.
4) Calcule o diluente: V2 − V1.
5) Dissolva, homogeneíze e complete o volume em balão volumétrico.
Exemplo de checklist aplicado: alvo 30 mL na diluição 1/20 → Valíquota = 30/20 = 1,5 mL e diluente 28,5 mL; misture suavemente até homogeneizar.
Volta aos básicos: três formas clássicas de calcular
Porcentagem em massa (m/v): × 100. Procedimento: dissolva o soluto em ~80% do volume, homogeneíze e complete até o volume final. Exemplo: 10% (m/v) de NaCl → 10 g em 100 mL de solução.
Porcentagem em volume (v/v): × 100. Exemplo: preparar 1000 mL a 5% (v/v) de etilenoglicol → 50 mL de soluto + água até 1000 mL. Não some volumes “na calculadora”; meça e complete no frasco volumétrico.
Soluções molares: M = mol de soluto / 1 L de solução. Se usar massa, massa grama / massa molar / volume (L). Exemplo: 1,0 M de NaCl → 58,44 g em 1,00 L; para 0,10 M, 5,844 g; para 0,50 M, 29,22 g.
Esses três jeitos cobrem a maioria das rotinas: escolha a forma compatível com seu método e aplique de maneira consistente do início ao fim da preparação.
Perguntas de prova e treino (com gabarito)
• KMnO4 0,50 M (15 mL) + 35 mL de água → Mf = 0,15 M.
• HCl 5,0 M para 200 mL de 1,0 M → Vi = 40 mL (complete até 200 mL com solvente).
• NaOH 0,20 M (100 mL) para 0,050 M → Va = 300 mL de água.
• Soro 0,9% (m/v) de NaCl (0,900 g/100 mL) → 0,154 mol·L−1.
Use essas respostas como conferência. Refaça as contas por conta própria para consolidar os passos e ganhar agilidade.
Boas práticas de documentação e segurança
• Registre lote, pureza do reagente, data e responsável por cada preparação.
• Anote temperatura ambiente e densidade quando relevantes (especialmente em % (v/v) e % (m/m)).
• Utilize EPI adequados (óculos, luvas, jaleco) e leia as fichas de segurança (FISPQ) dos reagentes.
• Em soluções corrosivas (como HCl concentrado), sempre adicione ácido à água, e não o contrário;
• Descarte resíduos conforme as normas locais;
• Calibre vidrarias e valide micropipetas periodicamente.
Quando usar molaridade, molalidade, porcentagens ou ppm
• Molaridade (M): ideal para reações químicas e estequiometria (relaciona diretamente mols e volume da solução).
• Molalidade (m): útil quando a temperatura varia (independe do volume, que se expande/contrai), focada em massa do solvente.
• Porcentagens: ótimas para formulações rápidas, preparos de rotina e descrições industriais.
• ppm: preferencial em análises ambientais e traços, em que as concentrações são baixas.
A decisão depende do método, dos requisitos de exatidão e das condições experimentais. Verifique o protocolo e mantenha a unidade consistente em relatórios e cálculos.
Referências e leituras recomendadas
Guias de química analítica, bioquímica clínica e práticas laboratoriais são excelentes para aprofundar conceitos de diluições seriadas, cálculos de concentração e segurança. Obras didáticas e materiais universitários reforçam a teoria com exemplos, enquanto notas técnicas de laboratórios ajudam a padronizar procedimentos e evitar retrabalho.
Se quiser ir além, procure compêndios de química analítica, manuais de laboratório e textos de bioquímica/biofísica, além de materiais institucionais sobre cálculos laboratoriais e preparo de soluções. Eles oferecem exercícios, tabelas de massas molares e checklists detalhados.
Dominar concentrações e diluições não é só decorar fórmulas: é entender o que cada unidade comunica, aplicar as relações certas e garantir coerência de início ao fim. Com atenção às unidades, à equação C1V1 = C2V2, ao fator de diluição e às boas práticas de preparo, você minimiza erros, ganha tempo e eleva a confiabilidade dos seus resultados na bancada.
