- O paracetamol continua a ser o analgésico de primeira escolha na gravidez, quando usado na menor dose eficaz e pelo menor tempo possível.
- Estudos observacionais sugerem associações com autismo e TDAH, mas pesquisas com controle entre irmãos não confirmam relação causal.
- Febre alta e dor intensa não tratadas na gestação trazem riscos comprovados para mãe e feto, superando os potenciais riscos do uso prudente de paracetamol.
- Agências reguladoras e sociedades científicas internacionais mantêm o uso de paracetamol na gravidez, desencorajando a substituição por AINEs como o ibuprofeno.
Tomar paracetamol na gravidez é um tema que gera dúvidas, medos e muitas manchetes alarmistas. Nas últimas décadas, milhões de gestantes usaram esse analgésico e antipirético para controlar dor e febre, e ao mesmo tempo foram surgindo estudos que levantaram suspeitas sobre possíveis efeitos no neurodesenvolvimento e na saúde reprodutiva dos bebês. Entre notícias contraditórias, declarações políticas polêmicas e documentos científicos densos, é normal que qualquer grávida se sinta perdida.
Hoje, a melhor evidência disponível e a posição das principais agências reguladoras e sociedades científicas convergem em um ponto-chave: o paracetamol continua a ser o analgésico e antipirético de primeira escolha na gravidez quando usado corretamente. Isso não significa uso livre e indiscriminado, mas sim um uso prudente (na menor dose eficaz e pelo menor tempo possível) e sempre que houver indicação clínica, sobretudo para controlar febre e dor intensa, que também representam riscos reais para o feto.
Paracetamol na gravidez: o que dizem as autoridades de saúde
Diversas agências reguladoras internacionais revisaram de forma independente os estudos sobre paracetamol na gravidez e, até o momento, não encontraram prova de relação causal com autismo ou outros transtornos graves do neurodesenvolvimento. Isso inclui organismos como a MHRA (Reino Unido), EMA (União Europeia), FDA (Estados Unidos), TGA (Austrália), Health Canada e a AEMPS (Espanha).
No Reino Unido, o Departamento de Saúde e Assistência Social emitiu um comunicado reforçando que o paracetamol continua a ser considerado seguro na gravidez, recomendado como analgésico de primeira linha para gestantes, desde que tomado conforme as orientações da bula e do profissional de saúde. O texto destaca que não há evidências de que o uso de paracetamol pela mãe cause autismo nos filhos.
A diretora de segurança da MHRA, Dra. Allison Cave, enfatizou que não existe prova de que o paracetamol na gestação provoque autismo e que o medicamento segue como primeira opção para dor e febre na gravidez, justamente porque a alternativa (deixar esses sintomas sem tratamento) também pode ser perigosa para o feto.
A Agência Europeia de Medicamentos (EMA) revisou o tema em 2019 por meio do seu comitê de farmacovigilância (PRAC). A conclusão foi que os dados sobre possíveis efeitos no neurodesenvolvimento são inconclusivos, levando à inclusão de uma advertência nos folhetos: os estudos epidemiológicos mostram resultados não definitivos, sem comprovar um dano direto.
A AEMPS, agência espanhola, reforça que uma grande quantidade de dados em gestantes que utilizaram paracetamol não aponta aumento de malformações ou efeitos negativos estruturais no feto. Assim, o uso continua permitido na gravidez, sempre com a recomendação de empregar a menor dose que alivie o sintoma e pelo menor período possível.
A FDA, por sua vez, decidiu atualizar a informação de produto para citar a possível associação entre uso de paracetamol na gravidez e diagnósticos futuros de autismo ou TDAH, mas na própria nota deixa claro que não há relação causal demonstrada. A agência lembra ainda que o paracetamol é o único medicamento de venda livre aprovado para tratar febre durante a gestação nos EUA e que febres altas não tratadas podem ser prejudiciais ao embrião e ao feto.
O papel de sociedades científicas de obstetrícia e ginecologia
As principais sociedades de obstetrícia e medicina materno-fetal mantêm uma postura alinhada: o paracetamol segue sendo o analgésico e antipirético preferencial na gravidez, usado com critério. Isso é sustentado por décadas de experiência clínica e por análises robustas da literatura científica.
O Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas (ACOG) publicou um comunicado específico sobre paracetamol na gestação e neurodesenvolvimento. Nele, afirma que o acetaminofeno continua a ser o fármaco de primeira linha e que o conjunto atual de evidências não sustenta um vínculo causal com autismo, TDAH ou outras alterações do desenvolvimento neurológico.
A Society for Maternal-Fetal Medicine (SMFM) emitiu declarações oficiais em resposta a anúncios políticos que sugeriam um “alto risco” de autismo associado ao paracetamol. A entidade reforçou que os estudos mais bem desenhados, controlando adequadamente fatores genéticos e ambientais, não mostram aumento de risco quando a análise é feita entre irmãos expostos e não expostos dentro da mesma família.
A FIGO (Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia), o Royal College of Obstetricians and Gynaecologists e outras entidades europeias mantêm a mesma recomendação: o paracetamol pode e deve ser utilizado na gravidez quando clinicamente indicado, com prudência, e evitando-se AINEs como ibuprofeno, que têm contraindicações claras em vários períodos da gestação.
Vários autores ligados a essas sociedades ressaltam ainda o impacto negativo que mensagens alarmistas, muitas vezes associadas a discursos antivacina ou a litígios judiciais, podem ter na confiança das pacientes. Afirmações não baseadas em evidência sólida podem levar gestantes a evitar tratar febre importante, com consequências comprovadas para a saúde materna e fetal.
Estudos sobre autismo, TDAH e outros transtornos do neurodesenvolvimento
Ao longo dos últimos anos, diversos estudos observacionais apontaram associações entre uso de paracetamol na gravidez e maior frequência de TDAH, TEA (transtorno do espectro autista), dificuldades de linguagem, menor QI e outros problemas de comportamento. Esses trabalhos, em geral, baseiam-se em questionários às mães sobre o uso do medicamento durante a gestação e em avaliações posteriores do desenvolvimento das crianças.
Uma grande revisão usando a metodologia Navigation Guide, publicada em 2025 por Prada e colaboradores, reuniu 46 estudos sobre acetaminofeno e neurodesenvolvimento. Cerca de metade dessas pesquisas encontrou alguma associação positiva, enquanto outras não detectaram relação significativa ou até sugeriram risco reduzido. Apesar da amplitude do trabalho, especialistas apontaram limitações metodológicas importantes.
Entre as falhas mais destacadas nessa revisão estão o uso predominante de autorrelato materno para medir a exposição, o que gera alto risco de viés de memória, a escassez de dados sobre dose e duração do uso, a grande heterogeneidade na forma de medir os desfechos (vários testes e critérios diferentes) e o controle incompleto de fatores de confusão genéticos, ambientais e sociais.
Metanálises anteriores chegaram a encontrar razões de risco combinadas em torno de 1,19 para TEA e 1,34 para TDAH, mas com heterogeneidade estatística elevada e baseadas em estudos observacionais sujeitos à mesma problemática: dificuldade em separar o efeito do medicamento dos fatores que levaram ao seu uso (dor, infecção, febre, condições maternas prévias etc.).
Uma crítica frequente é que as mães de crianças com transtornos do neurodesenvolvimento podem recordar ou relatar de forma diferente seu uso de medicamentos, comparadas às mães de crianças sem problemas. Esse viés de recordação pode inflar associações que, na prática, não representam uma relação causal direta.
Grandes coortes populacionais com controle entre irmãos
Os estudos considerados hoje mais robustos sobre paracetamol na gravidez e autismo/TDAH são aqueles que utilizam o chamado “controle entre irmãos”. Nesses modelos, pesquisadores comparam crianças da mesma família, nascidas de mesma mãe e pai, em que um(a) foi exposto(a) ao paracetamol no útero e o outro(a) não, ou em que houve exposição em intensidades diferentes.
Um estudo sueco publicado em 2024 na revista JAMA acompanhou cerca de 2,48 milhões de crianças nascidas entre 1995 e 2019. Em análises tradicionais, observou-se um aumento discreto no risco de autismo e TDAH em filhos de mulheres que usaram paracetamol na gestação. Contudo, quando os autores aplicaram o modelo entre irmãos, ajustando para fatores genéticos e ambientais compartilhados, essas associações desapareceram.
Os índices de risco ajustados entre irmãos ficaram muito próximos de 1 (por exemplo, 0,98 para autismo, com intervalo de confiança que inclui 1), o que indica ausência de aumento significativo de risco. Resultado semelhante foi observado para TDAH e deficiência intelectual, reforçando a hipótese de que os sinais vistos em modelos mais simples eram, em grande parte, fruto de confusão familiar.
Esses achados ganham peso quando se lembra que irmãos de crianças com autismo têm cerca de 20% de chance de também serem autistas. Ou seja, há um forte componente genético e de ambiente compartilhado que precisa ser levado em conta, sob pena de atribuir ao medicamento um efeito que pode, na verdade, ser da própria predisposição familiar.
Um grande estudo de base populacional no Japão, com mais de 200 mil crianças, também utilizou comparações entre irmãos e não encontrou aumento de risco de autismo associado ao uso materno de paracetamol. Este trabalho reforça a consistência dos resultados suecos em outra população com estrutura de saúde e características sociais distintas.
Paracetamol como possível disruptor endócrino e efeitos reprodutivos
Além dos potenciais impactos neurológicos, alguns estudos em humanos e modelos animais sugerem que o paracetamol possa agir como um possível disruptor endócrino. Isso significa que, em determinadas circunstâncias, o fármaco poderia interferir na ação de hormônios, afetando processos de desenvolvimento reprodutivo e urogenital.
Pesquisas experimentais e epidemiológicas apontaram associação entre uso prolongado ou em altas doses de paracetamol na gravidez e alterações urogenitais em fetos do sexo masculino, como encurtamento da distância anogenital (um marcador de exposição hormonal alterada), maior frequência de criptorquidia (testículos que não descem para a bolsa escrotal) e possíveis alterações na maturação puberal.
Em meninas, alguns trabalhos sugeriram adiantamento da puberdade após exposição intrauterina prolongada ao paracetamol, embora os resultados ainda sejam heterogêneos e insuficientes para estabelecer uma relação causal firme. Várias dessas análises foram feitas com base em questionários maternos e sem dados precisos de dose e duração.
Um ponto que chama atenção é que, justamente por atravessar a placenta e a barreira hematoencefálica, o paracetamol chega ao feto em fases em que o cérebro e o sistema reprodutor estão em pleno desenvolvimento. Isso levanta a necessidade de cautela, sobretudo quando se cogita uso repetido e sem indicação clara, apenas por “hábito” ou para desconfortos leves que poderiam ser manejados de outra forma.
Na prática clínica, diante dessas incertezas, vários especialistas em medicina fetal recomendam evitar uso desnecessário do medicamento, priorizando a menor dose eficaz e o menor tempo de tratamento, principalmente no primeiro trimestre e quando não se trata de febre alta ou dor realmente incapacitante.
Estudos sobre comportamento infantil e problemas de conduta
Um estudo bastante citado, feito com dados da coorte Avon (ALSPAC), no Reino Unido, avaliou quase 7.800 mães que reportaram uso de paracetamol na gestação. As mulheres foram perguntadas sobre o consumo do medicamento por volta das semanas 18 e 32 de gravidez, e novamente quando seus filhos tinham 5 anos. Aos 7 anos, aplicou-se um questionário padronizado para detectar problemas de comportamento.
Os resultados mostraram que o uso de paracetamol nas semanas 18 e 32 de gestação se associou a maior probabilidade de sintomas de hiperatividade, problemas de conduta e dificuldades emocionais nas crianças. Curiosamente, o uso de paracetamol depois do nascimento, tanto pelas mães quanto pelos pais, não apresentou essa associação.
Os autores interpretaram esse achado como indício de que o possível efeito ocorreria intraútero, embora reconheçam limitações importantes, como a ausência de detalhe sobre dose, frequência e duração do tratamento. Apenas saber se a mãe “usou” ou “não usou” paracetamol numa determinada janela pode mascarar realidades muito diferentes de exposição.
Outros trabalhos europeus, como os realizados com dados de coortes em Barcelona e outras cidades, também sugeriram relação entre exposição pré-natal ao paracetamol e sintomas do espectro autista e de TDAH. Entretanto, a própria literatura destaca a necessidade de mais estudos com desenho metodológico mais rigoroso para separar correlação de causalidade.
Em paralelo, análises mais recentes chamam a atenção para o papel dos chamados “fatores de confusão por indicação”: gestantes que tomam paracetamol com frequência podem ter quadros de dor crônica, infecções recorrentes, febre alta ou outras condições que, por si mesmas, podem impactar o desenvolvimento do feto.
Fechar os olhos à febre e à dor também é perigoso
Ao discutir riscos potenciais do paracetamol, é essencial colocar na balança o que acontece se febre e dor forem simplesmente ignoradas na gravidez. Estudos mostram que febre alta em fases precoces da gestação está associada a maior risco de aborto espontâneo, defeitos do tubo neural, malformações cardíacas, fenda labial e palatina, entre outras complicações.
Metanálises sobre febre na gravidez apontam ainda relação com parto prematuro e restrição de crescimento fetal em estágios mais avançados. A própria infecção subjacente à febre tem sido implicada como possível fator de risco para autismo e outros problemas de neurodesenvolvimento, independentemente do antitérmico usado.
Sociedades como a SMFM e a ACOG enfatizam que, para muitas gestantes, tratar febre com paracetamol é uma intervenção de benefício comprovado, especialmente quando a temperatura está elevada e associada a infecções potencialmente graves ou a risco obstétrico. Não tratar pode significar expor o feto a um estresse térmico e inflamatório prolongado.
No campo da dor, cefaleias intensas, dores dentárias, lombalgias severas ou crises álgicas associadas a outras condições podem impactar sono, alimentação, pressão arterial e bem-estar geral da gestante. Tudo isso também influencia o ambiente intrauterino, o que torna pouco realista recomendar que a mulher simplesmente “aguente” qualquer dor por medo do paracetamol.
É justamente por esse equilíbrio delicado que as recomendações oficiais convergem em um roteiro simples: usar paracetamol na gravidez quando realmente for necessário, com a menor dose eficaz, pelo menor tempo, e sempre que possível após avaliação de um profissional de saúde.
Consumo real de paracetamol na gravidez e informação às gestantes
Pesquisas em vários países indicam que o paracetamol é amplamente utilizado por mulheres grávidas. Estimativas apontam consumo em torno de 50% a 65% das gestantes em nível global, chegando a cerca de dois terços em alguns estudos norte-americanos e europeus.
Um estudo prospectivo com puérperas num grande hospital relatou que aproximadamente 67% das mulheres utilizaram paracetamol em algum momento da gestação. A maior parte delas respeitou a dose terapêutica diária (menos de 4 g/dia) e quase metade usou o medicamento por períodos curtos, inferiores a três dias.
As que atingiram doses de 4 g/dia ou mais o fizeram, principalmente, em contextos de cefaleia intensa, quadros gripais com febre e dores dentárias importantes. A distribuição do uso pelos três trimestres foi relativamente homogênea, com uma parte das gestantes relatando uso em dois trimestres e cerca de um quinto ao longo de toda a gravidez.
Nesse mesmo estudo, a prescrição veio majoritariamente de médicos de atenção primária e ginecologistas, refletindo que o uso não é apenas por automedicação, mas frequentemente dentro do sistema de saúde. Ainda assim, uma proporção relevante de gestantes acreditava que o paracetamol não tinha qualquer efeito sobre o feto, e mais da metade havia recebido pouca ou nenhuma informação sobre riscos potenciais e doses seguras.
Os autores chamam a atenção para a necessidade de estratégias de educação em saúde que esclareçam melhor o uso judicioso do paracetamol. Enquanto não houver evidência mais sólida que justifique uma mudança drástica nas recomendações, o foco deve ser informar e orientar, em vez de proibir sem base ou, ao contrário, incentivar um consumo banalizado.
Polêmica política, tribunais e conflitos de interesse
Em 2025, declarações do então presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em conjunto com figuras como Robert F. Kennedy Jr., trouxeram o tema do paracetamol e autismo para o centro do debate público. Ele sugeriu que gestantes deveriam evitar ao máximo o medicamento e insinuou que a FDA confirmaria um risco muito elevado de autismo associado ao seu uso.
Essas falas foram rapidamente contestadas por especialistas, sociedades científicas e pelo próprio fabricante de Tylenol. Críticos apontaram que as declarações se baseavam em leituras seletivas de estudos com fragilidades metodológicas e ignoravam análises mais abrangentes, como os grandes estudos com controle entre irmãos.
A revisão de Prada et al., frequentemente citada nesses contextos, foi alvo de questionamentos adicionais, incluindo o fato de que um de seus autores atuou como perito remunerado em ações judiciais coletivas contra fabricantes de paracetamol. Em 2023, um tribunal federal dos EUA rejeitou seu testemunho, considerando que não havia fundamento científico suficiente para as alegações apresentadas.
Essa mistura entre ciência, política e litígios jurídicos contribui para confundir o público e, muitas vezes, amplifica mensagens alarmistas em redes sociais. Enquanto isso, órgãos reguladores adotam uma postura mais cautelosa, reconhecendo as incertezas mas evitando conclusões precipitadas que não se sustentam quando os dados são analisados de maneira rigorosa.
Profissionais de obstetrícia e ginecologia reforçam que recomendações clínicas não podem ser guiadas por pressões políticas ou por pareceres elaborados para processos judiciais. A prática deve basear-se na totalidade da evidência, considerando tanto estudos que sugerem possíveis associações quanto aqueles que, com melhor controle de confusão, não confirmam aumento de risco.
Ibuprofeno e outros AINEs não são alternativa segura na gravidez
Diante das dúvidas em relação ao paracetamol, muitas pessoas pensam imediatamente em trocar para ibuprofeno ou outros anti-inflamatórios não esteroides (AINEs). Contudo, essa substituição costuma ser ainda mais problemática na gestação.
Os AINEs, incluindo o ibuprofeno, têm contraindicações claras em vários estágios da gravidez, especialmente no terceiro trimestre, devido ao risco de fechamento precoce do ductus arteriosus fetal, alterações renais no feto, oligohidrâmnio (redução do líquido amniótico) e potenciais complicações hemorrágicas.
Mesmo no primeiro trimestre, o uso de AINEs é desaconselhado por muitas diretrizes, pois há sinais de maior risco de aborto espontâneo e outras complicações. Por isso, as agências reguladoras e sociedades científicas reforçam que, para dor e febre na gravidez, o paracetamol é a opção de escolha — e não o contrário.
Isso não significa que o paracetamol seja isento de risco em qualquer dose. Em quantidades excessivas, mesmo fora da gravidez, é bem conhecido seu potencial hepatotóxico, podendo causar dano grave ao fígado. Mas, dentro das doses recomendadas, em curso curto e com indicação clínica, o balanço entre benefícios e riscos na gestação segue favorável.
Para sintomas leves, como pequenos desconfortos musculares ou dores de cabeça ocasionais que melhoram com hidratação, descanso e medidas não farmacológicas, muitas vezes dá para tentar alternativas antes de recorrer ao comprimido. A decisão, porém, deve ser individualizada e, quando possível, discutida com o profissional que acompanha o pré-natal.
O quadro geral que emerge da literatura e das orientações oficiais é complexo, mas relativamente coerente: há estudos observacionais que sugerem possíveis associações entre uso de paracetamol na gravidez e vários desfechos em crianças, porém essas associações tendem a enfraquecer ou desaparecer em análises com melhor controle de fatores genéticos, ambientais e de indicação. Ao mesmo tempo, os riscos de não tratar febre alta e dor intensa na gestação são bem documentados e têm impacto direto na saúde materno-fetal. Nesse cenário, o paracetamol permanece como ferramenta terapêutica importante, que não deve ser demonizada nem banalizada, e sim usada com critério, informação e acompanhamento profissional.